A “troca” do voto por dentaduras ou pares de óculos é uma prática que faz parte da cultura nordestina desde a época dos currais eleitorais, dos coronéis e das grandes oligarquias. Atitude que, pelo grau de miséria que sempre assolou os habitantes do grande sertão nordestino, contou com o beneplácito da sociedade. Educação cívica, a conscientização da importância do voto e o que este representa para a sociedade, seja ela distrital, municipal, estadual ou nacional, prescede a educação formal, a alfabetização, a alimentação, o trabalho e a saúde para todos os governados. Do homem do campo, que convive diariamente com a fome e a sede estampada nos olhos dos seus filhos, dos munícipes, que morrem baleados nos comércios de sua cidade porque sua cidade não tem viatura policial nem contigente policial armado e preparado, se costuma exigir conscientização política. Campanhas publicitárias caríssimas são feitas alertando-os do perigo de “venderem seus votos”. Qual é o crime? Matá-los de sede por falta de caminhão pipa, como ocorre em Antonina do Norte? Ou matar sua sede negociando o único bem que os governantes precisam de forma igualmente vital?
sobrevivência
No município de Tauá, localizado na macrorregião do Inhamuns, onde o drama da seca verde dizimou rebanhos, consumiu as forças do homem e inviabilizou até a agricultura de subsistência, a campanha eleitoral tem mostrado o lado mais cru do ser humano na luta pela sobrevivência. As discussões nos “bate-papos” que surgem nos bares, nos restaurantes, na praça principal, nas rodas no final de tarde na beira da calçada, têm como epicentro a venda de votos e principalmente a venda do apoio e espaço público a determinado candidato. O debate sobre política ideológica, que sempre movimentou os homens intelectuais ou iletrados, cosmopolitas ou interioranos cedeu espaço para a discussão da tabela de preços. Participar de carreatas rende para cada eleitor que estiver no carro até R$ 40,00; colocar fotos de candidatos nos muros de suas residências ou comércios está tabelado em R$ 200,00. Se for para retirar o cartaz de um candidato e colocar outro, o preço sobe.
O negócio está tão rentável que os adeptos desta prática estão pedindo a Deus para que a campanha se prolongue até o segundo turno. O sentimento de ceticismo e indignação com a classe política, que esquece suas promessas verbalizadas com tanta veemência, justifica este comércio conforme a afirmação de um eleitor, que teve sua identidade preservada por medo de sofrer represálias por parte da Justiça Eleitoral: “O que vemos é muita corrupção e roubalheira.
Esta decisão de estarmos negociando o apoio a um ou outro candidato é uma forma de expressar a nossa indignação. Nós é que sofremos, não os políticos. Em minha casa, são dez votos e ninguém irá votar de graça. Ou negociamos ou então iremos anular os votos. Depois que são eleitos com os nossos votos, vão embora. De quatro em quatro anos, é que eles vêm aparecer aqui em Tauá. Só se lembram do eleitor neste tempo de campanha, aí todo mundo é bom, por isto é que temos mesmo é que negociar os votos”. (Amaury Alencar, com participação de Mimosa Pessoa, especial para O Estado).
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