Reportagem especial


Regina Navarro>> "Não é fácil ser fiel", afirma autora
Para Regina Navarro Lins, autora de “A cama na rede” e “Se eu fosse você”, lançamentos Ed. BestSeller, a ideia de que um parceiro deve se tornar coisa do passado.

Os dois livros que agora estão sendo lançados surgiram da interação com internautas em seu site. Você diria que esse público é representativo dos brasileiros médios?
Penso que sim, embora alguns placares sejam surpreendentes, como por exemplo o da pergunta: “Vc gostaria de fazer sexo a três?”. Imaginei que muitas pessoas responderiam Sim, mas nunca pensei que o percentual chegasse a 77%. Estamos no meio do processo de uma profunda mudança das mentalidades, e o anonimato facilita dizer o que se deseja e não se tem coragem de revelar aos outros.

No livro A Cama na Rede, você faz 50 perguntas e as pessoas respondem Sim ou Não, além de dizerem o que pensam. No final você comenta as respostas. No comentário sobre a questão da fidelidade, você diz: “Alguns não concordam com a ideia de posse, que é a tônica da maioria das relações estáveis. Para eles a fidelidade está no sentimento recíproco que nutrem e nas razões que sustentam a própria vida a dois. Mas isso não tem nada a ver com ter ou não relações sexuais com outra pessoa.” É difícil ser fiel?
Sim. Não é nada fácil. Apesar de todos os ensinamentos que recebemos desde que nascemos – família, escola, amigos, religião – nos estimulam a investir nossa energia sexual em uma única pessoa, a prática é bem diferente. Nessa questão, 72% disseram que já foram infieis. Desde as décadas de 60/70, o comportamento amoroso está se transformando. O amor que conhecemos começa a sair de cena, levando com ele a idealização do par romântico, com a ideia de os dois se transformarem num só. A exigência de exclusividade, que daí se origina, começa a perder a importância. Acredito que num futuro próximo seremos mais livres para dar vazão aos nossos desejos e teremos plenas possibilidades de viver sem culpas. Acredito que será possível ter relações estáveis com várias pessoas ao mesmo tempo, escolhendo-as pelas afinidades. Talvez uma para ir ao cinema e teatro, outra para conversar, outra para viajar, uma parceria especial para o sexo, e assim por diante. A ideia de que um parceiro único deva satisfazer todos os aspectos da vida tem grandes chances de se tornar coisa do passado.

Muita gente afirma que o ciúme faz parte do amor, mas 44% dos pesquisados por você não concordam com isso. No livro há relatos de quem não consegue se controlar e também de quem acredita que ciúme em pequenas doses faz bem. O que você acha?
Eu também não concordo que o ciúme faz parte do amor. Independente da forma como o ciúme se apresente — discreto ou exagerado —, ele é sempre tirano e limitador. Não só para quem ele é dirigido, mas também para quem o sente. O desrespeito que se observa numa cena de ciúme não se limita às agressões físicas. Até uma cara emburrada durante um passeio, por exemplo, pode impedir que se viva com prazer. Geralmente o ciumento possui duas características básicas: baixa autoestima e incapacidade de ficar bem sozinho. Quem é inseguro, não se acha possuidor de qualidades e tem uma imagem desvalorizada de si próprio, teme ser trocado por outro a qualquer momento. Para evitar isso, restringe a liberdade do parceiro e tenta controlar suas atitudes. Só quem acredita ser uma pessoa importante não sente ciúme. Sabe que ninguém vai dispensá-lo com tanta facilidade. E se tiver desenvolvido a capacidade de ficar bem sozinho, sem depender de uma relação amorosa, melhor ainda. Pode até sofrer em caso de separação, mas tem certeza de que vai continuar vivendo sem desmoronar.

Quando você pergunta se com o tempo o tesão pelo parceiro (a) diminui, 72% respondem que sim. No seu comentário você diz: “Para se sentirem seguras, as pessoas exigem fidelidade, o que sem dúvida é limitador e também responsável pela falta de tesão no casamento. A certeza de posse e exclusividade leva ao desinteresse, por eliminar a sedução e a conquista.” O que fazer então quando o tesão acaba?
Essa é uma questão séria, principalmente para os que acreditam ser importante manter o casamento. As soluções são variadas, mas até as pessoas decidirem se separar há muito sofrimento. Alguns fazem sexo sem vontade, só para manter a relação. Outros optam por continuar juntos, vivendo como irmãos, como se sexo não existisse. E ainda existem aqueles que passam anos se torturando por não aceitar se separar nem viver sem sexo. Penso que a única forma de mudar essa situação que atinge a tantos casais é reformular as expectativas que são criadas a respeito da vida a dois, como as ideias de que os dois vão se transformar num só, que quem ama não faz sexo com mais ninguém, e outras tantas mentiras criadas para aprisionar as pessoas e tornar a vida delas bastante insastisfatória.

No livro há relatos bem interessantes de pessoas que foram trocadas por outro (a). O percentual dos que viveram essa experiência chega a 72%. É muito difícil se recuperar depois disso?
Quando alguém é trocado por outro numa relação amorosa, o sofrimento é intenso e é difícil elaborar essa perda. A falta da pessoa amada provoca uma sensação de vazio e desamparo. Se o parceiro prefere outra pessoa para viver ao seu lado, quem é excluído se sente profundamente desvalorizado, com a autoestima bastante abalada. É comum numa situação de rejeição serem reeditadas inconscientemente todas as rejeições sofridas desde a infância, exacerbando a dor do momento. Sem que se perceba, se chora naquela perda todas as outras anteriores. Mas ser trocado por outro não significa que se é inferior. Em muitos casos, a troca ocorre porque a pessoa objeto da nova paixão possui algum aspecto que satisfaz inconscientemente uma exigência momentânea do outro, sem haver uma vinculação necessária com o parceiro rejeitado.

À pergunta “Existe algo no sexo que você gostaria de experimentar? O quê?” o placar chama a atenção, pois 95% responderam Sim. Ainda há muita repressão sexual?
Existe sim. Durante muitos séculos o sexo foi considerado abominável. A descoberta da pílula anticoncepcional mudou muito as mentalidades. Pela primeira vez na história o sexo se dissociou da procriação, podendo se aliar ao prazer. E as pessoas passaram a desenvolver cada vez mais o prazer sexual. Entretanto, encontramos ainda muita gente com inibições, censuras e tabus. As pessoas gastam um tempo enorme da vida com seus desejos, fantasias, culpas, medos, vergonha... Quantos desejos e fantasias são reprimidos por fugirem do padrão estabelecido?

No outro livro, Se eu fosse você..., há relatos de problemas amorosos vividos pelos internautas e diversas sugestões de pessoas que se colocam no lugar do outro. Chama a atenção o relato de uma mulher de 32 anos, que foi deixada pelo marido. Após dois anos encontrou começou a se relacionar com um homem. Ela diz: “Com ele, tenho o melhor e mais gostoso sexo que já conheci e sei que isso também acontece com ele!”. Mas ela se culpa muito e quer terminar o relacionamento porque ele é casado. Há mulheres que se relacionam sem problemas com um homem casado?
As relações extraconjugais se tornam cada vez mais comuns para os dois sexos, e cresce o número de mulheres solteiras, separadas ou mesmo casadas, que se relacionam com homens casados. Hoje, as mentalidades estão mudando bastante e já é possível encontrar mulheres que não desejam manter relações amorosas estáveis com uma única pessoa. Preferem ter encontros eventuais com o homem que amam, desde que haja muita emoção, sem correr o risco de cair na rotina. Assim, a relação com o homem casado não é problema algum para elas, ao contrário, pode até ser desejável por permitir uma vida livre, com vários outros interesses. Sem contar muitos homens casados, por viver uma relação morna com a esposa, chegam para o encontro com muito desejo e amor para dar.

Você está escrevendo o seu 11º livro, “O Livro do Amor”, há quatro anos, e será lançado, pela Best Seller, no final de 2011. Como ele aborda o amor?
O amor e o sexo estão entre as principais causas do sofrimento humano, obviamente excluindo a miséria e a doença. Todos os outros livros que escrevi tratam de relacionamento amoroso, mas senti necessidade de aprofundar o tema. Em O Livro do Amor faço uma grande viagem. Começo na pré-história e sigo por Grécia, Roma, Antiguidade Tardia, Idade Média, Renascença, Iluminismo, Século XIX, Século XX e atualidade. Aponto também as tendências para o futuro. Fiz uma grande pesquisa. O amor é uma construção social, e em cada época o amor se apresenta de uma forma. Isso significa que pode mudar completamente daqui em diante também. Neste momento, os padrões tradicionais de comportamento não estão dando mais respostas. Não tendo mais modelos para se apoiar, abre-se a possibilidade de cada um escolher sua forma de viver. Penso que a leitura do livro contribuirá para a mudança das mentalidades, para que as pessoas possam viver com mais prazer.

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