Não vou me estender sobre quem ganhou o debate. As pesquisas se dividiram, com um empate técnico com Ryan à frente na CNN, e Biden vencendo entre uma amostragem de eleitores indecisos na CBS. Nada para soltar fogos de nenhum lado.
Acho que o vice-presidente democrata deu respostas melhores e com mais estofo do que o deputado republicano, mas perdeu muitos, muitos pontos com aquelas gargalhadas fora de hora (sério, o que era aquilo? Alguém fez o antidoping depois do confronto?).
Ryan também mostrou segurança e deixou claro que não é nenhum moleque como o oponente tentou pintá-lo, mas, ao contrário de Biden, estava frio até para falar de coisas pessoais. E se perdeu onde não podia se perder, na resposta sobre impostos (o público monitorado pela CNN gostou mais do democrata aí).
No saldo, não me parece que haverá grande mudança nas pesquisas de intenção de voto.
O que me chamou a atenção, porém, foi o contraste entre os dois vices e os titulares de sua chapa. E o debate de quinta foi muito melhor.
Barack Obama e Mitt Romney são mais preparados do que Biden e Ryan, ou ao menos assim pensam seus partidos. Talvez pelo excesso de ensaios, porém, os dois preferiram as evasivas e os ataques aos detalhes de sua plataforma. O primeiro debate presidencial não revelou nada de substancial sobre os planos de cada um.
Biden e Ryan, pelo contrário, pareciam à vontade. E pareciam ter lido o livro todo, não só o resumo para o vestibular. Talvez porque esse fosse o único debate entre os dois. Talvez porque fosse a chance que tinham para mostrar em rede nacional aos eleitores independentes, no caso de Biden, que não é só uma máquina de gafes, e, no de Ryan, que não é imaturo nem tão radical. Talvez tenha sido a competência impressionante da mediadora Martha Raddatz, da rede ABC, que não deixou nenhum dos dois fugir das respostas.
Fato é que os vices parecem ter assimilado muito melhor o conteúdo das plataformas.
Incrível que isso tenha vindo de dois populistas (Biden à esquerda de Obama, e Ryan à direita de Romney). Entre as não poucas coincidências que os dois dividem, está o fato de virem de cidades com grande população operária – o democrata é de Scranton, na Pensilvânia, e o republicano de Janesville, em Wisconsin.
São católicos devotos, que começaram a trabalhar muito cedo — muito mais cedo do que os titulares de suas chapas — e se elegeram antes de completarem a terceira década de vida. Presidiram comissões respeitadas no Congresso (Biden a de relações exteriores no Senado; Ryan a de Orçamento na Câmara). E ambos têm pendor pelas promessas grandiosas.
Mais importante, é fácil enxergá-los como dois americanos médios, e empatizar com aquele entre os dois que afine melhor com a sua orientação política.
Obama e Romney, por sua vez, têm experiências de vida esdrúxulas à média da população; Obama com sua vivência multicultural e sua ancestralidade africana, Romney egresso de uma casta política e econômica elevada e devotado a uma religião que enfrenta preconceito. Os dois estudaram em Harvard, os dois foram treinados para ser vencedores, e os dois têm dificuldade para mostrar calor humano.
Debater não é governar, verdade, e o populismo bidenista e ryanista às vezes cansa. Mas os sujeitos formados pelo palanque fizeram um debate com muito mais conteúdo e apelo do que aqueles que aprenderam oratória na melhor (ou uma das melhores) faculdade do planeta e poliram sua retórica com marqueteiros.
Para o debate da semana que vem, sugiro a Barack e Mitt trocar um dedinho de prosa com Joe e Paul.
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