Pobre
sofre
Em
Sobral, fomos criados não propriamente com pompa e circunstancia. Fomos bem
criados. Sempre tivemos uma cidade além de seu tempo, seja na educação, na
cultura, na saúde, no vestuário, na elegância, por fim, chegamos mesmo a
rivalizar com a capital em bens como, por exemplo, valores à cama e mesa do
séculos 18 pro século 19. O porto do Ceará, o que recebia a moda européia, era
Camocim. Pras coisas chegarem a Fortaleza tinham que passar por Sobral graças à
Estrada de Ferro Sobral-Camocim, depois Rede de Viação Cearense. Então,
nascemos e crescemos falando francês, um piano em cada casa, sedas e rendas
portuguesas e francesas, modelitos recém lançados na Europa. Sempre tivemos
mesa farta, vinho de castas nobres,uisquinho jamais batisado, embora por vias
meio marotas, mas não por culpa nossa, apenas consumíamos. Ainda hoje só em
Sobral tem um doce árabe chamado fartes, que é um encantamento. Os pastéis da
Tia Regina, as queijadas da Zaira, os alfinins da Semíramis, os perus do
Tiburcinho são quitutes que enfeitam ainda hoje as mesas mais exigentes do povo
mais exigente do Brasil. Aí, um povo pobre, que nunca viu nada igual, vai pro
meio fio reclamar que Cid Gomes, governador nascido em Sobral, estudante aluno
do Padre Osvaldo e da Iracema Pompeu, não podia contratar, por um tempo de século-seculorum,
bufets para receber autoridades e pessoas acostumadas àquilo que normalmente se
serve em Sobral. Caviar? Salmão? Que besteira é essa de dizer que isso não é coisa pra cearense servir? Outro dia,
no restaurante principal da CNN, em Atlanta, na Geórgia, pedí no almoço um
prato à base de salmão. Sabe quanto custava um prato à base de tilápia “do Brazil”? Era US$3,00
dólares mais caro que o salmão. Um simples ceviche, comidinha que o deputado
Heitor Ferrer disse que nunca viu, é um prato nobre à base de peixe cru, muito
saboroso para uma entrada decente, uma espécie de overture d’apetit. Ótimo e de
extremo bom gosto. E vai pela aí, que
não pretendo falar dos perfumes franceses, champanhes e vinhos das casas de
Rotshild e Romanées Conti que são comuns hoje porque aprendemos ontem que a
vida é boa quando se pode usufruir do fruto do nosso trabalho seja particular
ou em defeza dos interesses do povo. Ser pobre não obriga ninguém a andar roto
nem passar fome. Isso de reclamar de um cardápio a ser servido por garçons é
coisa de pobre. Pobre pobre demarré marré marré, de ci, sabe de onde vem? Sabe nada! Do bairro do Marais,
em Paris, antigamente zona pobre, baixa, da Cidade Luz. O Fernando Hugo acaba
tendo razão: quem gosta de miséria é intelectual, ou zangado sem(?) causa.
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