Uma esfinge sem segredos chamada Teori Zavascki. Ou: Ninguém entendeu a jabuticaba jurídica do doutor. E os que acham que entenderam estão estupefatos! Está livre o homem que mais assustava o governo
O
ministro Teori Zavascki protagonizou uma das cenas mais patéticas da história do
Judiciário brasileiro em muitos anos. Ninguém entendeu nada. Ou todo mundo
entendeu tudo. Num caso ou noutro, a reação é de perplexidade. Conversei ontem
com alguns operadores do direito: juízes, advogados, promotores, pessoas de
tendências diversas.
Está
todo mundo de queixo meio caído, muitos achando que o país começa a flertar com
uma forma muito particular de insegurança jurídica que, na superfície, parece
ser apenas idiossincrática; na essência, talvez seja coisa muito pior. Comecemos
a história pelo fim: dadas todas as pessoas que estavam presas pela Operação
Lava-Jato — e que o ministro Zavascki mandou soltar, para depois recuar —, só
uma ficou mesmo fora da cadeia: Paulo Roberto Costa. Trata-se do ex-diretor da
Petrobras que representa o elo entre três frentes de um escândalo: a Petrobras,
o doleiro Alberto Youssef e partidos políticos. Se era para soltar alguém,
ninguém pior do que ele: foi preso no momento em que destruía
provas.
Agora
pensemos um pouco nas circunstâncias. O natural seria que o advogado de um três
parlamentares com foro especial por prerrogativa de função recorresse ao Supremo
alegando que seu cliente tinha o direito de ser investigado pelo tribunal
superior. E quem são os três? Os deputados André Vargas (ex-PT-PR), Luiz Argôlo
(SDD-BA) e Cândido Vaccarezza (PT-SP). Em vez disso, quem tomou a iniciativa de
indicar a eventual impropriedade foi o defensor de… Paulo Roberto da Costa. Já
há aí, vamos convir, material suficiente para estranhamento.
Zavascki,
então, condescende com a argumentação — E NOTEM QUE, ATÉ AQUI, ESTAMOS DENTRO DE
UMA ARGUMENTAÇÃO TECNICAMENTE RAZOÁVEL — e decide, então, solicitar o envio de
todos os autos ao Supremo. Havendo, de fato, entre os investigados, pessoas com
direito ao foro diferenciado, é razoável que a investigação seja conduzida pelo
STF. Posso até achar, sim, que havia risco de fuga desse ou daquele — e já vimos
isso acontecer, não é? —, mas notem: a decisão, ainda nesse ponto, é
tecnicamente defensável, embora Zavascki pudesse, quando menos, ter arbitrado
uma fiança. Como os investigados não foram ainda condenados, não podem ficar
presos indefinidamente. Tudo indica que não têm mais como prejudicar as
investigações. Então, vá lá, que fossem soltos.
Ocorre
que a decisão gerou uma compreensível reação de indignação, e a Justiça do
Paraná lembrou ao ministro as circunstâncias que envolviam alguns dos
investigados. O que faz, então, Zavascki? Volta atrás, determina que todos
permaneçam em cana, menos um: Paulo Roberto Costa. Por quê? Está aí um segredo
que talvez deva morrer com ele? Justificar essa decisão apenas com o fato de
que, afinal, foi seu advogado quem entrou com a reclamação vai um pouco além do
ridículo. Antes que continue, quero abrir um parêntese importante.
Desmembramento
da investigação
As leis brasileiras já não são um exemplo de clareza e coerência, e decisões tomadas pela Justiça começam a deixar tudo ainda mais confuso. Notem bem: pessoalmente, acho ilógico — além de não encontrar nada na lei que o justifique — o desmembramento de uma simples investigação. O que quero dizer com isso? Digamos que um deputado federal seja acusado de cometer um crime em parceria com um sujeito sem direito a foro especial. Faz sentido que o parlamentar seja investigado pelo Supremo, e o outro, pela Justiça comum? Imaginem: um pode acabar réu, e o outro não! Foros distintos podem tomar decisões distintas sobre o mesmo crime. Quando já se tem o processo, vá lá. Mesmo assim, pode-se chegar a estranhos resultados, não é? Começo a encerrar o parêntese, voltando a Zavascki.
As leis brasileiras já não são um exemplo de clareza e coerência, e decisões tomadas pela Justiça começam a deixar tudo ainda mais confuso. Notem bem: pessoalmente, acho ilógico — além de não encontrar nada na lei que o justifique — o desmembramento de uma simples investigação. O que quero dizer com isso? Digamos que um deputado federal seja acusado de cometer um crime em parceria com um sujeito sem direito a foro especial. Faz sentido que o parlamentar seja investigado pelo Supremo, e o outro, pela Justiça comum? Imaginem: um pode acabar réu, e o outro não! Foros distintos podem tomar decisões distintas sobre o mesmo crime. Quando já se tem o processo, vá lá. Mesmo assim, pode-se chegar a estranhos resultados, não é? Começo a encerrar o parêntese, voltando a Zavascki.
Reitero:
há sentido técnico em requisitar os autos e determinar a soltura dos presos,
desde que tomadas algumas medidas prudenciais, de cautela — e uma pesada fiança
(está na lei) seria uma delas. O QUE NÃO FAZ SENTIDO NENHUM E O QUE
NINGUÉM, DEFINITIVAMENTE, CONSEGUE EXPLICAR É POR QUE ELE DETERMINOU, DE NOVO, A
PRISÃO DE TODO MUNDO, MENOS DE UM.
E
não há como ignorar que Paulo Roberto Costa é justamente a personagem que,
potencialmente, mais ameaça o, digamos, statu quo e o governo. Ele está no grupo
que tomou decisões sobre Pasadena. Ele está no grupo que tomou decisões sobre a
refinaria de Abreu e Lima; ele era um dos elos da estatal com os partidos
políticos.
Texto publicado originalmente às 4h06
Por
Reinaldo Azevedo
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