Opinião

Paes de Andrade

Wilson Ibiapina

Nessa terça feira, 23, véspera do dia de São João, foi a missa de sétimo dia para Paes de Andrade. Na igreja, enquanto o padre rezava, recordava como Paes de Andrade  se comportava exemplarmente num meio de traições, desonestidade, falta de ética e de moral. 

Não lhe faltou coragem para enfrentar a ditadura militar nem os adversários políticos. Um dia, no Ceará, ao chegar a um recinto na companhia do jornalista Hermenegildo Sá Cavalcante, sentiu-se cercado de inimigos políticos com seus capangas. Puxou duas pistolas e entregou uma a Hermenegildo a quem pediu cobertura. O jornalista soltou a arma no chão e gritou: - Paes, quero ser testemunha!
Gostava de se gabar da pontaria que nunca precisou usar ao longo de sua carreira política. Acertou muita gente com palavras, a arma que usou toda vida para defender suas teses, o estado de direito, a democracia.

Era um intelectual. Quando chegou a Lisboa como o segundo cearense a ocupar a embaixada brasileira (o primeiro foi Dario Castro Alves), Paes já conhecia de cor e salteado a obra de Eça de Queiroz, recitava Fernando Pessoa. Publicou dezenas de livros, entre eles, a reestruturação agrária do Nordeste (1968), Afirmação democrática do Nordeste (1971), O itinerário da violência (1976), O poder absoluto (1977), A violência da reforma e a denúncia de Caracas (1979), Francisco Pinto, as imunidades parlamentares e a Lei de Segurança Nacional (1980), As secas (1980), O poder ou o subpoder (1980), A greve no ABC e os bispos do Brasil (1980), A universidade e o professor (1980), CNBB e reflexão cristã, O Poder Legislativo e o golpe militar na Bolívia (1980), A inviolabilidade absoluta, Dom Hélder e o seu cinquentenário de ordenação (1981), Comemoração do CLX aniversário da Confederação do Equador, 1824-1984 (1984), Proposta de ação econômica e social (1985), A Interparlamentar e os direitos humanos (1987), O Brasil e a União Interparlamentar (1988), Perfis parlamentares: Martins Rodrigues (1989), e Presença na Constituinte.
A História Constitucional do Brasil, que escreveu com Paulo Bonavides, teve três edições e chegou a ser lançada no Instituto Mário Soares, em Lisboa.

Dramático. Quando recebia qualquer tipo de pressão gostava de exclamar, com as mãos levantadas: “querem me matar!”
Certa feita, depois de uma eleição, Paes foi pagar com um imóvel o dinheiro que pedira emprestado para a campanha. O ganancioso empresário, queria mais: “só tem isso, Paes?   - Não, tenho meu figado, o meu coração...

Honradez foi sua marca. A única coisa que conseguiram dizer dele foi que levou um grupo de amigos à Mombaça, sua terra natal, em uma das doze vezes que assumiu a presidência da República. Era presidente da Câmara e substituía o presidente José Sarney. Uma viagem que todos os que passaram pelo Planalto fizeram para homenagear suas origens. Foi um amigo dos amigos, correto e leal. Deixa a viúva Zildinha, quatro filhas, netos e bisneta. Um cearense pra ficar na história do estado e do país.

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