Um texto, um depoimento

Paes de Andrade (que morreu ontem aos 88 anos) foi perseguido pela imprensa brasileira depois de uma decisão que poucos lembram.
Quando presidente interino do Brasil, Paes não viajou apenas para Mombaça — viagem simbólica, sublinhe-se. Paes também mandou para o espaço sideral os cretiníssimos banqueiros brasileiros.
Foi Paes de Andrade quem alterou a sistemática do FGTS. Na época, os banqueiros sequestravam o dinheiro do FGTS durante 45 dias, irrigando a bolsa como todos as tenebrosas transações inventadas e ainda a inventar.
Paes em uma só canetada passou os recursos do FGTS para a Caixa Econômica Federal e o trabalhador passou a receber os seus direitos de forma automática. Imperdoável.
Vocês entenderam? Paes teve a ousadia de mexer no bolso dos banqueiros. Quanta petulância. Como pode, um nordestino que pintava o bigode, mexer no dinheiro do trabalhador usado pelos banqueiros no chique mercado de capitais?
Para implantar a medida, Paes ameaçou de demissão o então ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega.
Tive a honra de participar da resistência quixotesca de 1998, que tentou eleger Paes para o senado, ao lado de Dorian Sampaio, Sebastião Nery, Mauro Santayama. Um lado sabia escrever verdades e o outro, escrever mentiras. Um lado, ainda tipografia e o outro, videotape. Venceu a mentira e o vídeo — sempre caro de fazer e que envelhece muito rápido, diferente da tipologia da letra que fere a fogo. Na época, o cearense e também o brasileiro votou enganado a favor da manutenção de um governo perdulário...
Paes também autorizou a construção do açude Castanhão, que garante o abastecimento d'água para Fortaleza. Ele fez muita coisa, Paes não é uma nota de pesar. É um livro, um longa metragem, um docudrama sobre como a coisa ruim ainda persegue fácil a coisa certa no nosso Brasil.
A última vez que encontrei com o Paes: — Hey Paes, como vai? Ele respondeu retumbante: — Cortando vento com espada de pau como se fosse de aço toledano. Sorri, feliz é o povo que tem um líder orgulhoso de ainda ser uma criança.
Céus, vastos e poderosos céus da República brasileira, auxiliem com vossos cajados a travessia misteriosa pelo rio Estige de mais um sertanejo destemido que partiu para além das tristes leis desta gravidade.


Norton Lima Jr., jornalista e eu gosto dele.

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