Opinião

“Governo burla papel do Congresso ao dar porte de armas por decreto”, afirma Instituto Sou da Paz
Organização pontua que proibição de que pessoas pudessem andar armadas nas ruas foi um dos grandes avanços da Lei 10.826/2003, que desacelerou o crescimento de homicídios por arma de fogo no Brasil
O decreto nº 9.785, assinado nesta terça-feira pelo presidente Jair Bolsonaro, burla o papel do Congresso Nacional ao conceder porte de arma para várias categorias, proibido pela legislação de controle de armas no país, questão que deveria passar pelo crivo do Poder Legislativo, avalia o Instituto Sou da Paz.
“O governo não respeita o direito brasileiro propondo decreto contrário à lei. Quem legisla é o Congresso Nacional. Além disso, ignora os efeitos trágicos para Segurança Pública ao possibilitar que milhões de pessoas andem armadas”, afirma Ivan Marques, diretor-executivo do Instituto Sou da Paz. “Esta medida ignora o consenso científico de que aumentar a quantidade de armas em circulação aumenta a quantidade de homicídios, especialmente na realidade brasileira de altos índices de criminalidade e de resolução violenta de conflitos. São mais de 45 mil assassinados com arma de fogo por ano”, diz.
A proibição de que pessoas pudessem andar armadas nas ruas foi um dos grandes avanços da Lei 10.826/2003, que ficou conhecida como Estatuto do Desarmamento. Antes da implantação do Estatuto, o crescimento anual desses homicídios era de 8,1% - índice que foi reduzido para 2,2% ao ano desde então, segundo o último Mapa da Violência, conforme gráfico abaixo.
Redução dos índices de homicídios por arma de fogo após a implantação do Estatuto do Desarmamento, em 2004

Vítimas de homicídios por AF.png

“O presidente põe a perder um avanço da segurança coletiva, colocando acima dela o direito individual de grupos e em benefício da indústria de armas”, comenta Ivan.
Mudanças
Além de possibilitar o porte para diversas categorias, como políticos com mandatos eletivos, caminhoneiros, jornalistas, atiradores ou colecionadores de armas, o decreto amplia o conceito de arma de uso permitido, autorizando que civis tenham acesso a armas que hoje são usadas apenas pelas Forças Armadas e de segurança pública. Também aumenta o limite de munições de 50 por ano para 1.000 de uso restrito e 5.000 de uso permitido, diminuiu o controle sobre as vendas dessas munições, e aumentou o tempo de validade do porte de cinco para 10 anos.
Algumas categorias passam, inclusive, a não ter limite para compra de munições, como membros das forças de segurança, militares, forças policiais, guardas municipais, colecionadores, caçadores, atiradores, entre outras.
“Entendemos que há muito a ser feito para a diminuição da violência no Brasil, como retirar armas e munições das mãos de criminosos, combater o crime organizado, reduzir e esclarecer homicídios, melhorar a eficiência e valorização do policial e gerir melhor o sistema de segurança pública”, diz, Ivan. “No entanto, insistir em medidas que facilitem a compra e circulação de armas em vias públicas só irá piorar o grave cenário da segurança pública enfrentado pela população brasileira”.

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