Brasileiro foge pra Portugal com medo da loucura do País
Crise e Bolsonaro geram um novo êxodo de brasileiros para Portugal
17.jul.2019
- Brasileiros participam de um encontro na "Casa do Brasil", associação
criada por brasileiros que vivem em Portugal Imagem: Patricia de Melo Moreira/AFP
Em Lisboa
25/07/2019 11h14
Empreendedores,
trabalhadores pouco qualificados, estudantes ou homossexuais que se
sentem ameaçados: os brasileiros voltaram a desembarcar em massa em
Portugal, que, para eles, representa um refúgio de segurança e a
perspectiva de um futuro melhor. Essa onda de imigração, como
Portugal não via desde o início dos anos 2000, começou em 2015 com a
crise econômica durante os últimos anos do governo PT e ganhou novo
fôlego com a chegada ao poder do presidente de Jair Bolsonaro.
Os
brasileiros são a maior comunidade estrangeira em Portugal, com pouco
mais de 105 mil pessoas em situação regular em 2018, um recorde
histórico alcançado após um aumento de 23,4% em um ano, segundo a
polícia de fronteiras (SEF). Alexandre Saboia fechou seu restaurante em São Paulo para abrir outro nos subúrbios de Lisboa. Em
São Paulo, "a insegurança era pior a cada dia", conta à AFP o
restaurador, que desembarcou em Lisboa há um ano com sua esposa e duas
filhas adolescentes. "Nós hesitamos entre Miami e Lisboa, e
finalmente escolhemos Portugal por segurança e pela língua comum",
explica o empresário de 44 anos. "Pouco depois da minha chegada,
tive a oportunidade de assumir um pequeno restaurante que eu restaurei
em Parede", localizada à beira mar, na periferia oeste de Lisboa. "Voltar
ao Brasil está fora de questão", diz Saboia antes de acrescentar, após
alguns segundos de reflexão: "A menos que seja uma emergência, é
claro!". Ele teve que vender tudo para ir para Portugal.
Fuga da homofobia
Com
mais dinheiro do que ele, 740 investidores brasileiros e suas famílias
obtiveram autorização de residência graças ao sistema de "vistos
dourados" estabelecido desde o final de 2012 pelo governo português. Atrás
dos chineses, os brasileiros representam o segundo contingente a se
beneficiar dessas "autorizações de residência para investimento"
concedidas em troca, por exemplo, de um investimento de pelo menos
500.000 euros na compra de imóveis. Meg Macedo, uma brasileira de
33 anos, lésbica, veio a Lisboa para dar seguimento a seus estudos de
teatro em um país que ela classifica como "aberto e progressista".
"Viver com medo por causa do que somos tornou-se algo complicado".
20.jul.2019 - Brasileira Meg Macedo se mudou para Lisboa, um lugar "aberto e progressista", segundo ela Imagem: Patrícia de Melo Moreira/AFPA
retórica inflamada do presidente de direita "legitimam atos
homofóbicos", diz sua compatriota Debora Ribeiro, uma linguista que mora
no Porto (norte) e que fundou a rede Queer Tropical para ajudar os
homossexuais que deixaram o Brasil a se instalar em Portugal. Bolsonaro, famoso por seus comentários racistas e homofóbicos, disse que preferia ter um filho morto do que gay. Estudantes
brasileiros também migram para universidades portuguesas. Seu número
passou de pouco mais de 11.000 em 2017 para cerca de 18.000 no ano
passado, segundo dados da Direção Geral de Estatísticas da Educação. Eles
são atraídos por "um país culturalmente próximo" e "reputado por sua
qualidade de vida e segurança", explica à AFP o secretário de Estado
para a Educação Superior, João Sobrinho Teixeira. Além disso, a
situação na Grã-Bretanha, por causa das "incertezas do Brexit", e os
Estados Unidos, que endureceram os critérios para a entrada de
latino-americanos, "afastam muitos estudantes que tradicionalmente se
voltavam para esses países" e que, agora, optam por Portugal, acrescenta
o sociólogo Pedro Gois, da Universidade de Coimbra.
Imigração tradicional
Segundo
ele, a realidade excede em muito os números oficiais: cerca de 300 mil
brasileiros vivem atualmente em Portugal, segundo suas estimativas, que
incluem aqueles que fogem ao controle das autoridades ou os
naturalizados. As novas facetas da imigração brasileira não devem
nos fazer esquecer que "Portugal continua a atrair uma imigração mais
tradicional" através de ofertas de emprego no setor de serviços,
hotelaria ou comércio, diz Cyntia de Paula, presidente da associação
Casa do Brasil, que acompanha os brasileiros em seu processo de
integração.
A associação "Casa do Brasil" acompanha os brasileiros em seu processo de integração em Portugal Imagem: Patricia de Melo Moreira/AFP"Muitos
são atraídos pelos salários que eles convertem em reais, mas esquecem
que os custos também são contabilizados em euros", explica Patricia
Banheiras, uma caminhoneira brasileira que destila seu conselho aos
candidatos à imigração em seu canal no YouTube. Em resposta a
perguntas de internautas e candidatos à imigração, Patricia, também
conhecida como "Pathy RJ", explica as medidas a serem tomadas para
trabalhar legalmente em Portugal, como validar uma licença para dirigir
caminhão ou diferenças de vocabulário. Vivendo há mais de 20 anos
em Portugal, mora em Figueira da Foz (centro). Ela começou a trabalhar
como vendedora antes de regressar ao transporte. Portugal já havia
experimentado uma primeira onda de imigração brasileira no início dos
anos 2000, quando o Brasil estava sofrendo com uma alta taxa de
desemprego e a situação favorável em Portugal estava levando o país a
procurar mão-de-obra. Mas muitos voltaram para casa durante a crise financeira que atingiu Portugal entre 2010 e 2015, diz Gois.
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