Esperando um sinal, Daciolo profetiza Presidência, mas está de olho no Rio

Resumo da notícia
- Depois de viralizar em 2018, Daciolo mantém sonhos na política
- Ele profetiza que será presidente e cogita candidatura no Rio em 2020
- Ex-deputado flertou com Podemos e Prona, antiga legenda de Enéas
- Daciolo afirma que o governo de Jair Bolsonaro oprime o povo
- Ele sustenta teoria da Ursal e estreita laços com Vasco da Gama
- Esposa do ex-parlamentar enfrentou leucemia e fez transplante
O
surpreendente candidato que, com uma Bíblia na mão, viralizou em memes
na internet e alcançou a marca de 1,3 milhão de votos na eleição presidencial de 2018
anda longe dos holofotes. Mas a presença marcante na campanha do ano
passado, em que ficou em 6º lugar, não deve ter sido o fim de uma
passagem, até o momento, meteórica pela política.
Para
Cabo Daciolo, 43, fé e política se misturam. O ex-deputado federal
profetiza que ainda será presidente da República e cogita a
possibilidade de disputar a Prefeitura do Rio de Janeiro em 2020.
A
campanha eleitoral do ano passado o fez conhecido nacionalmente, mesmo
filiado a um partido nanico — o Patriota — com poucos recursos
financeiros.
Iniciando a maioria de suas falas com a expressão "Glória a Deus" e mencionando teorias da conspiração como a da Ursal,
que seria uma liga de repúblicas socialistas na América do Sul, ele
terminou a corrida eleitoral à frente de candidatos mais conhecidos e
experientes como Henrique Meirelles (MDB), Marina Silva (Rede) e Alvaro
Dias (Podemos).
Da eleição para cá, o
bombeiro militar da reserva encerrou seu mandato como deputado federal;
diz ter recusado convites para cargos públicos; afastou-se do Patriota;
flertou com outros partidos; ajudou a cuidar da esposa, que enfrentou
uma leucemia; e aproximou-se do Vasco, seu clube de coração.
Defensor das candidaturas avulsas, ele espera "a porta ser aberta por Deus" para levar adiante uma nova tentativa eleitoral.
Relação direta com o Senhor e jejum no monte
Cabo
Daciolo alterna falas na primeira pessoa do singular com outras na
terceira pessoa do singular e outras mais na primeira pessoa do plural.
Em meia hora de conversa com a reportagem do UOL em São Paulo, cita Deus 29 vezes e Jesus Cristo outras oito. Na soma, mais de uma citação por minuto.
Filho
de uma fiel da Assembleia de Deus, o catarinense radicado no Rio de
Janeiro também frequenta esta igreja, porém é um cristão que procura
evitar os intermediários e falar diretamente ao "Pai".
A
igreja evangélica me ensinou a ler Bíblia. Quando entro no Congresso
Nacional, uma das minhas maiores decepções foi a própria bancada
evangélica. Quando eu visualizo aquilo entendi mais do que nunca o que
estava escrito na palavra, que o nosso corpo é templo e que eu preciso
ir para o monte jejuar, orar e buscar o Senhor e levar o amor. É o que
eu faço.
"Ir
para o monte" foi outra tirada surpreendente de Cabo Daciolo durante a
campanha eleitoral. Enquanto os outros candidatos cumpriam compromissos
tradicionais, ele anunciava retiros e se afastava.
Precisávamos
de orientações divinas para ir a um debate, para expor uma ideia, para
colocar uma pauta verdadeira e concreta de solução para a nação. Fomos
buscar sabedoria, discernimento, mansidão, um plano de nação. E
descíamos [do monte] para o debate e ali falávamos algumas verdades que o
povo entendeu, captou, tanto é que deu uma resposta positiva.
Parentes
e amigos de Daciolo afirmam que, mesmo antes da campanha eleitoral, ele
já tinha o hábito de subir montanhas e passar dias acampado, em jejum e
louvando o Senhor. O monte, diz ele, não é um só. Ele frequenta picos
como o Monte das Oliveiras, em Campo Grande, na zona oeste do Rio, e
outros na região metropolitana.
A varoa, o filho e o Vasco
Companheira
e assessora do ex-deputado, a jornalista Cristiane Daciolo foi
diagnosticada com leucemia no fim do ano passado. "A minha esposa estava
com um quadro de leucemia, um quadro muito sério", conta.
"Ela
foi curada de forma maravilhosa. Hoje não tem mais leucemia no sangue
dela. Ela fez o transplante de medula, está em casa com nossos filhos,
mas é um momento ainda delicado de acompanhamento. Continuamos voltando
para o hospital de 15 em 15 dias, às vezes de mês em mês."
O
que fez Daciolo aparecer publicamente no último ano foi seu time de
futebol. Para o ex-deputado, só uma intervenção divina salvaria o clube
da Cruz de Malta do rebaixamento para a Série B.
"Estávamos
vivendo um momento muito delicado com minha varoa, uma enfermidade
muito séria, que pegou toda a família de surpresa. As crianças [o casal
tem três filhos] ficaram muito abaladas com isso. Tenho um filho que é
apaixonado por futebol, assim como eu também fui. Minha infância foi o
futebol. Eu tinha sonho de ser jogador. Meu filho joga bola e é
apaixonado pelo Vasco", conta.
Fomos
ver um jogo do Vasco contra o Inter. Eu falei: 'filho, Deus tira o
Vasco da tabela rápido, assim como cura a mamãe'. E ele viu isso. O
Vasco saiu da zona de rebaixamento.
Ao
longo de 2019, Daciolo regressou a São Januário algumas vezes. Gravou
um vídeo para incentivar a torcida a se engajar na campanha de
participação do programa de sócio-torcedor do clube. Em novembro, chegou
a acompanhar a delegação vascaína em uma partida contra o São Paulo na
capital paulista.
Viu da arquibancada a
derrota do time, mas foi cumprimentado por torcedores rivais. "O
carinho das pessoas é muito grande, sabe? É uma coisa muito gostosa.
Alguns podem estar falando brincando 'Glória a Deus', muitos com uma
seriedade no 'Glória a Deus'. Mas um carinho muito real."
"Namoro" e "renúncia" no partido de Enéas
Daciolo,
que iniciou sua carreira política no PSOL, se diz fora do Patriota, mas
explica que ainda precisa ir a Brasília formalizar a desfiliação.
Ele
afirma ter recebido e recusado convites para ocupar cargos em
secretarias, mas não revela de quais governos. "Ninguém está dando cargo
e cadeira porque você é bonzinho. Eles querem você do lado, têm um
propósito. Essa política que adotam não me agrada."
No
primeiro trimestre, o ex-parlamentar reuniu-se com dirigentes do
Podemos — a presidente do nacional do partido, deputada federal Renata
Abreu (SP), e o presidente estadual do Rio, senador Romário.
Veículos
de imprensa chegaram a noticiar que Daciolo havia se filiado à legenda,
o que não se concretizou. "Houve uma foto nossa que bateram numa
reunião e logo depois disseram que eu estava no Podemos. Mas isso nunca
se firmou. Nunca estive no Podemos."
No
segundo semestre, ganhou força o "namoro" com o Prona, antigo partido
do nacionalista Enéas Carneiro, deputado federal morto em 2007.
Uma
fusão da legenda com o PL resultou na criação do PR na década passada.
Recentemente, dois grupos — um de São Paulo e outro do Rio — tentaram
resgatar o partido e registrá-lo no TSE (Tribunal Superior Eleitoral),
ainda sem sucesso.

Daciolo supreendeu Patrícia Lima, filha adotiva de Enéas Carneiro, ao desistir de assumir o comando do Prona
Imagem: Daniel Texieira/Estadão Conteúdo
Daciolo
passou a dialogar com o grupo paulista, que tem à frente a ex-deputada
estadual Patrícia Lima, filha adotiva de Enéas. A conversa avançou ao
ponto de o ex-deputado viajar a São Paulo no último dia 7 para
participar de um congresso nacional do partido.
Em
meio a imagens de Enéas, o salão que abrigou o encontro na zona oeste
de São Paulo tinha um painel anunciando Daciolo como presidente nacional
do Prona. Outros materiais da legenda traziam o nome do bombeiro da
reserva ao lado da dezena 56, antigo número da sigla, uma referência a
uma possível candidatura a presidente em 2022.
Para
a surpresa dos cerca de cem presentes, ele declarou no discurso que
apoiaria a tentativa, mas não assumiria o comando do processo e da
legenda.
"Teríamos que colher 492 mil
assinaturas [para conseguir o registro]. Agradeci o carinho, agradeci a
atenção. Verdadeiramente tenho uma admiração muito grande pelo dr.
Enéas, mas Daciolo tem características, em alguns pontos, diferentes do
dr. Enéas. Dr. Enéas é insubstituível para o Prona. E é uma imagem muito
limpa [a] do Prona. Eu não posso ser o presidente do Prona. Fico
preocupado com partidos políticos porque o montante em dinheiro que hoje
entra nos partidos motiva a corrupção."
Para
justificar a desistência, Daciolo também argumentou que a própria
Patrícia havia comentado que Enéas Carneiro dissera, antes de morrer,
que o Prona não deveria ser retomado. "Respeito o desejo do criador",
afirma.

Painel anunciava Daciolo como presidente nacional do Prona, partido que está sem registro no TSE
Imagem: Daniel Teixeira/Estadão ConteúdoPossível candidatura a prefeito do Rio
A
recusa em comandar o Prona também teria relação com a intenção do
ex-deputado de se candidatar a prefeito do Rio em 2020. Como seria
impossível registrar a legenda a tempo de disputar as eleições
municipais, ele teria de buscar outra sigla para participar do pleito de
outubro.
O Rio é um grande
desafio. Eu acho que o cenário do Rio de Janeiro é bem interessante.
Esse caos do Rio reflete de forma negativa para a nação. Da mesma forma
que uma solução para o Rio de Janeiro traz soluções diretamente para a
nação. Seria um passo, seria um caminho, temos que orar para visualizar
isso.
Enquanto não acerta com
uma legenda, Daciolo torce para que a proposta de liberação de
candidaturas avulsas avance no país. "[Sou] muito a favor [das
candidaturas avulsas]. Esse é o caminho da transformação política.
Acredito em pessoas, mas não acredito em partido."

Para Daciolo, Bolsonaro deveria se afastar dos projetos liberais que o ministro Paulo Guedes adota na economia
Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil"Governo Bolsonaro oprime o povo"
Na opinião do bombeiro da reserva, o governo Jair Bolsonaro (sem partido) decepciona e o presidente deveria rejeitar o liberalismo econômico do ministro Paulo Guedes.
Bolsonaro
era um dos poucos parlamentares que eu conversava dentro do Congresso
Nacional. Ele sempre foi contra essas reformas que fez. Por que agora
ele é a favor? O que mudou? Esse cenário de reforma mudou o quê no bolso
do trabalhador, do povo? Onde está o aumento de emprego, onde está a
diminuição da extrema pobreza? Então, esse não é o caminho correto.
Estão oprimindo ainda mais o povo.
Daciolo,
que esteve detido depois de liderar uma greve de bombeiros no Rio em
2011, faz questão de marcar outro contraponto a Bolsonaro ao defender a
população carcerária. "Me preocupa o cenário dos presos da nossa nação.
Eu zelo pelos presos. Temos que trazer a educação para o povo. Dar
educação, dar formação, dar curso técnico transforma uma nação. Isso não
está acontecendo."

Citada por Daciolo em debate eleitoral, Ursal virou meme e até bloco de Carnaval
Ainda a Ursal e a nova ordem mundial
O
ex-parlamentar ainda defende as teorias que propagou em 2018, como a da
Ursal, a suposta União das Repúblicas Socialistas da América Latina. "A
Constituição Federal no artigo número quatro, no parágrafo único, vai
falar da construção de uma sociedade latino-americana de nações. É uma
união para quebra de fronteiras rígidas. Esse é o desejo de centralizar o
poder em uma única liderança. Esse é o desejo para controlar a massa.
Para que isso aconteça, também vem um processo de destruição de massa."
A reportagem do UOL
checou o parágrafo citado. O texto afirma que o Brasil "buscará a
integração econômica, política, social e cultural dos povos da América
Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de
nações".
Tirando Getúlio Vargas, de
quem se diz admirador, ele afirma que os presidentes têm servido à nova
ordem mundial e entregado as riquezas do país.
"Lula
entregou também, igual ele [Bolsonaro] está entregando agora. E outros
entregaram também. [José] Sarney entregou, Fernando Henrique [Cardoso
entregou], todos que sentaram lá entregaram", afirma
Uma
grande verdade que visualizei é que esse papo de esquerda e direita é
mentira, eles são amiguinhos. É um cenário de dividir para conquistar. O
povo está brigando, e, com isso, um sistema por trás está controlando
tudo. Digo que é a nova ordem mundial. É um cenário que alguns podem
falar que é teoria da conspiração, mas cada vez mais fica mais claro
para a nação.
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