Josias de Souza
Guedes se arrepende e se desarrepende em seguida
O
arrependimento, como se sabe, é algo que ocorre no intervalo entre dois
pecados. Mas Paulo Guedes inovou. Ele conseguiu se arrepender e se
desarrepender na mesma frase. Quem ouviu não sabe se o ministro da
Economia pediu desculpas ou reafirmou a ofensa.
Na
semana passada, Guedes dissera que, num cenário de dólar barato, até as
empregadas domésticas estavam viajando para a Disney. Nesta
quinta-feira, escalado para discursar numa cerimônia no Planalto, o
ministro tentou se reposicionar em cena. Declarou o seguinte:
"Quando
fazemos política econômica, estamos pensando em todos os brasileiros e,
particularmente, nos mais humildes. E aquele modelo antigo, com juros
lá em cima, transformava os empresários e empreendedores brasileiros em
rentistas. Em vez de fazerem investimentos, criarem empregos...
Rentistas. Justamente, também as famílias mais humildes, empregadas
domésticas, inclusive, a quem eu peço desculpas, se puder ter ofendido,
dizendo que a mãe do meu pai foi uma empregada doméstica."
Quer
dizer: O czar da Economia pede desculpas às domésticas, mas não dá o
braço a torcer. "Se puder ter ofendido...", ele declarou, eximindo-se de
preventivamente de culpa. A plateia, condoída, aplaudiu. Mas as pessoas deixaram o Planalto sem saber se Paulo Guedes levaria sua avó à Disney.
Noutro
trecho confuso do seu discurso, o ministro fez referência à canelada
que o general Augusto Heleno dera no Congresso no dia anterior.
Abespinhado com o desejo dos parlamentares de controlar um pedaço do
Orçamento da União por meio de emendas impositivas, o general dissera
que o governo não pode aceitar as chantagens dessa gente. Rodrigo Maia e
Davi Alcolumbre, presidentes da Câmara e do Senado, chiaram.
Paulo
Guedes tomou as dores do general: "É normal que o Congresso queira
entrar no orçamento, mas não precisa pisar no nosso pé. Tem um orçamento
de R$ 1,5 trilhão, por que nós vamos brigar por causa de R$ 10 bilhões
ou R$ 15 bilhões ou R$ 20 bilhões?"
Ele
prosseguiu: "Pode haver um exagero de um lado, do outro. Todo mundo
fica nervoso, é natural isso. Às vezes, fica nervoso lá o Congresso,
achando que nós estamos pressionando. Às vezes, ficam nervosos os do
nosso time, do lado de cá, porque fala: 'Espera aí, nós temos o
presidencialismo, não estamos no parlamentarismo brando. Esse
empurra-empurra é normal, é pelada, um chutou canela do outro e tal, o
jogo segue'."
Como
resolver? Guedes sugeriu perseverar na busca do equilíbrio fiscal.
Reiterou a necessidade de aprovar as reformas tributária e
administrativa. Há no Congresso duas propostas de reformulação do
sistema tributário. Nenhuma delas traz as digitais do governo. A reforma
administrativa, que deveria ter sido enviada em novembro, continua no
gavetão dos assuntos pendentes do Planalto.
Ou
seja: o ministro da Economia pede ao Congresso pressa na aprovação de
reformas que o governo não fez ou ainda não entregou. Se Paulo Guedes
continuar soando assim, tão confuso, os brasileiros que apreciam o seu
trabalho vão acabar concluindo que se precipitaram ao enxergar um certo
ministro como ministro certo.
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