Lenio Streck destaca ironia no uso da Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito, sancionada por Jair Bolsonaro, para indiciá-lo por tentativa de golpe
Em entrevista concedida ao programa Boa Noite 247, o advogado e jurista Lenio Streck detalhou os bastidores da formulação e aprovação da Lei 14.197/21, que substituiu a antiga Lei de Segurança Nacional e se tornou peça-chave no indiciamento de Jair Bolsonaro e aliados por tentativa de golpe de Estado. O programa, transmitido pela TV 247, abordou a recente operação da Polícia Federal e os desdobramentos jurídicos que envolvem o ex-presidente.
“Eles sancionaram a lei que agora os levará à cadeia”, disse Streck, ressaltando a ironia de Bolsonaro, à época presidente, ter dado aval à legislação que inclui crimes como abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado, pelos quais ele próprio foi indiciado.
Um contexto de ameaças e autoritarismo
Segundo Streck, a proposta da nova lei nasceu em meio ao aumento do uso abusivo da antiga Lei de Segurança Nacional para perseguir jornalistas, ativistas e opositores políticos. “Havia uma ameaça iminente de golpe de Estado. Vocês se lembram quando Bolsonaro tentou interpretar, entre aspas, o artigo 142 da Constituição para justificar uma intervenção nos Poderes?”, recordou.
O projeto de lei foi apresentado em 2020, quando Bolsonaro ainda não tinha o controle pleno do Congresso, facilitando sua tramitação. Streck destacou o papel do então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e da deputada Margarete Coelho, relatora da matéria, além do trabalho conjunto com renomados juristas, como Pedro Serrano e Juarez Tavares, na formulação do texto.
Criminalização da tentativa de golpe
Um dos principais debates durante a elaboração da lei foi a criminalização da tentativa de golpe, ponto defendido pelo grupo de juristas. Streck explicou: “Nos disseram que só seria possível tipificar o golpe se ele fosse consumado. Respondemos que, nesse caso, estaríamos todos presos e as instituições fechadas”.
Esse entendimento resultou na inclusão de dispositivos que punem atos preparatórios. O artigo 359-L, por exemplo, prevê penas de 4 a 8 anos de prisão para quem tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito.
A operação e os indiciamentos
A Lei 14.197/21 fundamentou o recente indiciamento de Bolsonaro e mais 36 pessoas por crimes contra a democracia. A operação da Polícia Federal revelou um plano para assassinar o presidente Lula, o ministro Alexandre de Moraes e outras autoridades, além de organizar um golpe de Estado. “Os atos preparatórios estavam avançados; o plano só não foi executado por circunstâncias alheias à vontade deles”, afirmou Streck.
O reconhecimento internacional e o futuro do caso
Streck também mencionou que a legislação brasileira foi inspirada em normas internacionais de proteção à democracia. “Consultamos especialistas de outros países para garantir que a lei estivesse em conformidade com os mais altos padrões democráticos”, disse, citando o trabalho da deputada Margarete Coelho nesse processo.
Por fim, o jurista expressou confiança na responsabilização dos envolvidos. “A sociedade brasileira já reprovou esses atos. Agora, cabe à Procuradoria-Geral da República formalizar a denúncia e levar os responsáveis às barras dos tribunais.”
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