Lava Jato vai investigar obras de cinco aeroportos
Novas etapas da operação buscarão crimes que transcenderam a Petrobras
Viracopos e outros quatro terminais estão na mira da Lava Jato (Foto: Infraero)
As concessões e obras em cinco aeroportos,
entre eles o de Viracopos, em Campinas (SP) – parte do primeiro pacote
de transferência de infraestrutura para a iniciativa privada no
governo Dilma Rousseff, em 2012 – estão na mira das novas etapas
de investigação da Operação Lava Jato. A força-tarefa que apura
fraudes, desvios, corrupção e propina na Petrobrás vai buscar a partir
de janeiro os “crimes transcendentes” do esquema, conforme suspeita
o juiz federal Sérgio Moro.
Lista de 750 contratos alvo dos negócios ilícitos do doleiro
Alberto Youssef reforçou, na avaliação dos investigadores, a necessidade
de apurações em setores de infraestrutura como o de transportes. Além
do Aeroporto de Viracopos, que já aparecia nas investigações, estão
sob suspeita as obras de adequações no Aeroporto do Galeão, no Rio de
Janeiro, em 2008; do Aeroporto de Confins, em Minas Gerais, em 2011; do
Aeroporto Eduardo Costa, em Manaus, e a concessão estadual do Aeroporto
de Feira de Santana, na Bahia, em 2012. Três dessas obras (Confins,
Galeão e Manaus) estão na lista de 750 contratos apreendida com Youssef.
A soma dos valores registrados como preço da intermediação chega a
R$ 11 bilhões. Só com os três contratos que constam na lista de Youssef
(Confins, Galeão e Manaus) ele pode ter recebido R$ 4,4 milhões.
Na semana passada, ao rejeitar pedido de revogação da prisão
de executivos de empreiteiras, Moro escreveu que “embora a investigação
deva ser aprofundada” em relação a outras áreas, “é perturbadora” a
apreensão da planilha de Youssef, sugerindo que os crimes do esquema
“transcenderam a Petrobrás”. No caso do leilão de Viracopos, em
fevereiro de 2012, o consórcio vencedor tem como uma das sócias o grupo
UTC/Constran, alvo da Lava Jato. O leilão foi vencido por R$ 3,2
bilhões. Tanto a UTC como a Constran têm executivos na mira da operação.
A força-tarefa já havia encontrado elementos para apontar
“negócios bilaterais” entre a UTC e Youssef. Já a Constran,
incorporada pela UTC, aparece como beneficiária da intermediação de
Youssef para liberação de precatórios no governo do Maranhão. A
colaboração premiada de alguns dos alvos da investigação, entre eles o
próprio doleiro e dois executivos que operavam para a Toyo Setal
– Augusto Mendonça e Júlio Camargo – reforçou as suspeitas de ligação
de parte da sociedade que assumiu Viracopos com o chamado ‘clube’ de
empreiteiras que atuava na Petrobrás.
O monitoramento dos contatos que visitavam o escritório de Youssef em
São Paulo, onde eram realizados pagamentos de propina e acertos,
segundo ele próprio admitiu, também reforça a suspeita. Sete executivos e
funcionários da UTC/Constran – entre eles dois de seus donos, Ricardo
Pessoa e João de Teive Argolo, visitaram o prédio entre 2011 e 2012,
período em que os consórcios formados por ela vencem as concorrências de
Viracopos e também do Aeroporto Regional de Feira de Santana (BA).
O presidente do Conselho de Administração da Concessionária
Brasil Viracopos, João Santana, foi fotografado entrando no local.
Diretor da Constran e ex-ministro de Infraestrutura do governo Collor,
João Santana não foi alvo das buscas da sétima fase da Lava Jato,
denominada Juízo Final, mas foi qualificado nos autos.
“Possui registro de entrada no prédio de Youssef. Seus dois
últimos sobrenomes foram omitidos, porém como existe o registro
fotográfico compatível, foi possível identificá-lo”, destacou a PF,
abaixo da foto de Santana, da sua qualificação e do registro de entrada
no prédio.
O mais assíduo dos visitantes no prédio de Youssef é um funcionário
de nome Ednaldo Alves da Silva, que foi mais de 12 vezes nesse
período. Augusto Mendonça e Júlio Camargo contaram como funcionava o
‘clube’ de empreiteiras que fatiava obras públicas. Para
vencer licitações, Youssef e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás
Paulo Roberto Costa afirmaram haver esquema de pagamento de propina para
PT, PMDB e PP, que abasteceu também PSDB e PSB.
“Não se pode excluir a possibilidade do mesmo modus operandi ter
sido ou estar sendo adotado em outros contratos” com empresas e
entidades públicas, explicou Moro ao analisar e negar um pedido de
liberdade de um executivo do suposto cartel preso cautelarmente. A
planilha dos 750 contratos alvos de Youssef, um verdadeiro portfólio de
negócios a serem investigados, relaciona “obra pública, a
entidade pública contratante, a proposta, o valor, e o cliente do
referido operador, sendo este sempre uma empreiteira, ali também
indicado o nome da pessoa de contato na empreiteira”, descreve a Lava
Jato.
No caso das obras dos aeroportos, não necessariamente a “cliente”
foi contratada para a concorrência alvo, mas todas são alvo
da força-tarefa. Como o modus operando da organização
criminosa investigada na Lava Jato era a combinação de contratos e a
fraude em licitações, as empreiteiras podem ter sido contratadas
diretamente para outra obra ou terem prestado serviços terceirizados.
COM A PALAVRA, A ANAC
A ANAC informou que não sabe de cartel. “É importante ressaltar que
as concessões foram realizadas por meio de leilões públicos, baseados
em editais previamente submetidos a audiências públicas e com regras
que visavam maximizar a concorrência. Uma dessas regras impedia que
a Agência divulgasse os participantes habilitados antes de cada
leilão, ou seja, os concorrentes só foram conhecidos no momento de
cada leilão. O objetivo dessa estratégia foi justamente evitar
eventual conluio entre os participantes. Isso pode ser observado nos
resultados dos leilões: grande número de participantes e elevados ágios.
Leilão de São Gonçalo do Amarante = disputado por quatro grupos e
ágio superior a 300%. Leilão de Guarulhos, Brasília e Viracopos =
ágio médio de 347%. Leilão de Galeão e Confins = ágio médio de 253%”.”
Informou ainda desconhecer intermediação do doleiro Alberto Youssef
em alguma concessão ou obra. “As regras impostas pela ANAC, previstas
nos editais de concessão, foram todas cumpridas, razão pela qual
o resultado de todos os certames foram homologados por esta Agência.
A lisura dos processos de concessão foi evidenciada publicamente
em todos os atos adotados por esta Agência.”
COM A PALAVRA, A INFRAERO
A concessão de aeroportos é de responsabilidade da Anac
(Agência Nacional de Aviação Civil), não da Infraero. As contratações de
obras da Infraero são feitas mediante licitações públicas, não
são permitidas intermediações de quem quer que seja. Os contratos
são feitos diretamente com as empresas pelo grupo técnico encarregado
de cada licitação.
O Aeroporto de Manaus não foi concedido, é administrado
pela Infraero. E o Aeroporto de Feira de Santana não é administrado
pela Infraero.
COM A PALAVRA, A UTC/Constran
O senhor João Santana não é investigado na referida operação e
jamais foi “flagrado” em visita ao escritório de um doleiro. A UTC
desconhece a existência de um ‘clube de empresas’ e repudia afirmações
que a relacionam um suposto cartel. Ao longo de 40 anos a UTC
conquistou contratos sempre seguindo procedimentos legítimos.
COM A PALAVRA, o Consórcio Aeroportos Brasil Viracopos
O consórcio Aeroportos Brasil, vencedor do leilão de concessão
do Aeroporto Internacional de Viracopos, seguiu todas as regras do
edital de licitação e ganhou um Leilão publico na BM&F Bovespa com
oferta de R$ 3,821 bilhões, valor 159,75% acima do preço mínimo.
Importante ressaltar que o Aeroporto Internacional de Viracopos foi
objeto de um disputadíssimo leilão. Diversos consórcios formados por
algumas das maiores empresas do país participaram da disputa. Depois de
definido o vencedor, grupos perdedores tentaram reverter o resultado,
recorrendo inclusive à Justiça, que manteve o vencedor inicial,
atestando a lisura do processo.
COM A PALAVRA, A Construcap
Informou não ter sido contratada para as obras do Aeroporto do Galeão.
O governo da Bahia não retornou aos questionamentos. (Ricardo Brandt, Julia Affonso e Fausto Macedo/AE)