No cenário da adoção, onde esperança e realidade se entrelaçam, os números revelam não apenas estatísticas, mas também histórias de vida, expectativas e desafios. Neste sábado (25/05) é o Dia Nacional da Adoção que, no Brasil, é sempre uma jornada em busca constante de evolução e que se reflete nos números consolidados das estatísticas que falam mais que sobre a realidade. Falam de vidas e de esperança.
Segundo o Setor de Cadastro do Fórum Clóvis Beviláqua, há atualmente 393 pretendentes habilitados em Fortaleza para adotar, prontos para acolher um novo membro em suas famílias. Em contrapartida, 224 crianças e adolescentes encontram-se acolhidos, aguardando a oportunidade de um lar. Destes, 31 estão disponíveis para adoção imediata, enquanto cerca de 20 já estão em processo de aproximação com os pretendentes habilitados, em um delicado passo rumo à construção de novos laços familiares. Os números, no entanto, vão além das estatísticas frias e ganham contornos de esperança quando olhamos para os registros recentes. Em 2023, foram oficializadas 48 adoções através do Sistema Nacional de Adoção (SNA), um dado que representa não apenas um ato judicial, mas o início de uma jornada compartilhada entre pais e filhos.
Entretanto, o caminho da adoção também enfrenta obstáculos. De janeiro a maio deste ano, 13 adoções foram registradas no SNA em Fortaleza. Esse número, apesar de significativo, traz à tona a necessidade de um esforço contínuo para garantir que todas as crianças e adolescentes tenham a oportunidade de encontrar um lar afetuoso e seguro.
O juiz coordenador das Varas de Infância e Juventude de Fortaleza, Raimundo Deusdeth Rodrigues Júnior, disse que novos projetos serão implementados ao longo do ano, para fortalecer os programas vigentes. “Para as crianças e para os adolescentes institucionalizados, a adoção é um meio de grande importância para que estes possam ter seu direito à convivência familiar e comunitária garantido . Atuamos com bastante empenho e compromisso para que os processos tramitem da forma mais célere possível, no intuito de abreviar a permanência dos infantes em situação de acolhimento. Acreditamos que o cenário sempre pode melhorar e reafirmamos o compromisso de buscar o melhor interesse das nossas crianças e adolescentes. Pretendemos implementar, ainda no ano de 2024, projetos que fortaleçam a divulgação do programa de apadrinhamento a fim de melhorar as condições desses sujeitos quando ainda estão acolhidos. Um dos nossos grandes desafios é o reduzido número de profissionais que atuam nos estudos técnicos que envolvem a matéria. Buscando garantir a ampliação deste quadro, estamos realizando estudos com peritos cadastrados, bem como aguardamos o edital de concurso divulgado pelo Tribunal de Justiça do Ceará para esta área ainda este ano”, destacou.
Programa Entrega Legal
Um dos desafios que se apresentam é a necessidade de investir em políticas e programas que visam agilizar e facilitar o processo de adoção, ao mesmo tempo em que oferece suporte e assistência, tanto aos pretendentes quanto às crianças acolhidas. A criação de redes de apoio, a capacitação de profissionais e a conscientização da sociedade sobre a importância da adoção responsável são passos essenciais nessa jornada.
Uma das formas de evitar abandono de crianças recém-nascidas é a genitora aderir ao programa Entrega Legal, que consiste na entrega da criança para adoção de forma legalizada. Um dos projetos que abraçam essa causa é o Programa Entrega Legal em Adoção (ELA), da Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci), impactou positivamente.
A lei permite a entrega voluntária para acolher as mulheres e, ao mesmo tempo, preservar os direitos dos recém-nascidos. E evita situações que já vimos tantas vezes, de crianças deixadas nas ruas, nas calçadas e até em cestos de lixo. As condutas como abandono, maus tratos, infantícidio, entregas irregulares de recém nascidos a terceiros podem ser fruto de falta de conhecimento.
“Temos psicólogos e assistentes sociais que fazem interlocução com a saúde e com as gestantes que querem entregar o filho à adoção. É preciso dizer que não é crime e que são garantidos todos os aspectos possíveis penais. Tudo está normatizado”, explicou o presidente da Funci, Raimundo Gomes de Matos.
Demora adoção
Segundo o promotor de Justiça, Dairton Oliveira, o ELA impactou positivamente porque mais crianças foram entregues para adoção, mas por outro lado esse aumento não implicou na redução do tempo dos processos de adoção, nem do tempo que os pretendentes precisam ficar na fila de espera para adotar. Hoje, segundo o MP, o tempo de expectativa de espera na fila de adoção no Ceará é de quatro anos e quatro meses.
Segundo dados do MP-CE, o ELA foi instituído em outubro de 2022 e durante 2023 funcionou bem, dobrando o número de atendimentos a mães que entregaram seus filhos à adoção. No primeiro ano foram 38 crianças entregues através do programa. Em 2023 foram 60, enquanto que de janeiro a maio deste ano foram 18. “Atualmente todas as maternidades de Fortaleza estão preparadas para a Entrega Legal. Porém retrocedemos muito em relação ao que conseguimos antes da pandemia. Chegamos a ter expectativa de 60 adoções por ano, com dois anos e dez meses de espera na fila. Agora, são bem menos adoções anuais, 40 ou 50, mas com maior tempo de espera. Apesar do número de entregas ter aumentado, os processos não andam e o número de adoções na prática diminuiu. Isso é ruim, pois aumenta o número de crianças no abrigo. Os processos estão se acumulando por mais tempo. Os pretendentes, aqueles que querem ser pais, perderam o protagonismo. O direito deles é só de esperar”, destacou Dairton de Oliveira.