O PODER DA CHANTAGEM
Por Carlos ChagasHouve tempo, nos anos setenta, em que o Brasil parecia haver descoberto a panacéia universal, quem sabe a pedra filosofal. Eram os tempos bicudos do regime militar, mas, de repente, em meio à aguda crise dos preços do petróleo, anunciou-se o Plano do Álcool. Como sucedâneo para a gasolina cada vez mais rara e cara, tínhamos as condições para substituí-la pelo álcool: terra à vontade e sol. Chegamos a assistir 80% da produção de veículos nacionais ser adaptada ao álcool. Outra vez, dávamos lições ao mundo.
O sonho foi sabotado e desfeito. Claro que pela indústria petrolífera daqui e de fora, com espaço para a Petrobrás também torcer o nariz. Estimularam a ganância dos produtores de cana para chantagearem o governo, fosse elevando os preços do álcool, fosse optando por produzir açúcar, com preços sempre superiores no mercado.
Mataram o Plano do Álcool e nunca mais ele ressuscitou, apesar de andar feito zumbi em algumas noites escuras. Quando se inventam motores adaptados a álcool e a gasolina, sem necessidades técnicas sofisticadas, assistimos os produtores de cana exigirem equiparação, como agora, quando o governo autorizou aumento nos preços da gasolina. Mesmo assim, ou por conta disso, até importamos álcool dos Estados Unidos, ironicamente tirado milho, não da cana.
O cidadão comum, muito além da tecnocracia, não consegue entender a lógica da política de combustíveis. De produção infinitamente mais barata do que a gasolina, senão voltados para o passado, bem que poderíamos estar construindo novo futuro. O problema é que nem administrações militares, nem as do PMDB, com José Sarney, do PRN, com Fernando Collor, muito menos do PSDB, com Fernando Henrique, ou do PT, com o Lula e agora Dilma, ousaram enfrentar o desafio. A influência política dos usineiros, mais o poder da indústria do petróleo e seus penduricalhos, nacionais e estrangeiros, sem falar da indústria automobilística e sem esquecer a Petrobrás – todos impedem qualquer desenvolvimento racional dessa solução que seria e ainda é o álcool. Bem feito para nós, constatação de todos os dias em que vamos aos postos de venda de gasolina, sempre mais cara.